Reportagem: Luiz Felipe Fernandez/ A Tarde. Foto: Alberto Maraux/ SSP
A investigação da corregedoria da Polícia Militar da Bahia acerca da morte do soldado Wesley Soares, em março deste ano no Farol da Barra, em Salvador, foi concluída e apresentada nesta quinta-feira, 21, em coletiva de imprensa.
O Inquérito Policial Militar (IPM) concluiu que a ação dos agentes do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM foi em legítima defesa, e que psicólogos acionados e que tiveram contato com o policial no dia, indicam que ele teve um “possível surto” motivado por questões políticas.
Foi descartada a conexão da morte com qualquer insatisfação na sua atividade policial ou outros problemas de ordem do trabalho, ou pessoal.
De acordo com o inquérito, que anexa os laudos periciais, técnicos e exame de balística, os policias reagiram após Wesley atirar contra um dos dois grupamentos, localizados na rua Marquês de Caravela. Ele foi atingido na perna, e, mesmo caído, ainda atirou outras nove vezes contra os colegas de corporação.
No total, Wesley foi alvejado oito vezes, sendo sete das vezes em locais estratégicos, nas “extremidades” como pés, pernas, mãos e braços, e uma vez na cintura, que foi o tiro fatal.
“É importante frisar que Wesley foi atingido por sete disparos, um de raspão, que foram realizados por diversos PM’s. Quando houve no início a ação violenta, ele permanece atirando, todos os policiais do Bope, tanto da célula tática quanto o atirador, realizaram disparos. E todos que atingiram Wesley, exceto um na cintura, foram nas extremidades do corpo”, explicou o oficial encarregado pelo IPM e corregedor adjunto da PMBA, tenente coronel Agnaldo Ceita, que conta que mesmo ferido, no chão, ele tentou sacar outra arma que estava no coldre.
“Já no chão, buscando a segunda arma, ele tenta fazer a retirada deste armamento, mas já é impedido pela equipe do Bope que faz a contenção, retirando do seu poder as outras duas pistolas, uma no colete e uma no coldre”, completou.
A dificuldade em determinar a motivação passa pelo histórico de Wesley Soares, que até então não tinha nenhum registro de episódio violento ou problema na vida pessoal que justificasse a atitude. Uma carta do PM com ilações políticas em tom de revolta de sua autoria foi entregue pela família à polícia, mas não foram encontrados indícios de que o episódio foi motivado exclusivamente por estas questões. Também foi difícil concluir até mesmo se foi surto psicótico, já que o soldado nunca foi diagnosticado e nem fazia acompanhamento psicológico.
“Ele não possuía histórico de surtos psicóticos, não possuía acompanhamento, então não deu para fazer um diagnóstico de sua conduta. O que temos de informações de psicólogos que tiveram contato com o soldado Wesley, é que ele teve, possivelmente, não é conclusivo, existe a possibilidade de que tenha tido um surto psicótico vinculado a questões político-partidárias, mas é inconclusivo”, respondeu o tenente-coronel.
O soldado que trabalha em Itacaré foi socorrido pelos próprios colegas e levado em seguida por uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para o Hospital Geral do Estado (HGE), mas não resistiu e morreu.
Uma perícia particular, contratada pela Associação dos Policiais e Bombeiros Militares do Estado da Bahia (Aspra), assinada pelo Secrim, concluiu que Wesley não atirou na equipe tática, mas sim em diagonal e “por cima dela”.
O corregedor da PM disse que não teve acesso à perícia contratada, mas o laudo pericial do Departamento de Polícia Técnica (DPT) mostra o contrário, e é corroborado pelas versões dos oficiais do Bope que estavam na ação no dia.
“Posso falar sobre a perícia oficial realizada pelo DPT, que aponta, inclusive, pois eu fiz questionamentos, a relação do ângulo de tiro, distância que ele se encontrava da equipe, e essas respostas são conclusivas no laudo pericial. Os tiros foram efetuados em direção a equipe do grupamento tático na Marquês de Leão. A conclusão do laudo pericial está no inquérito e é o documento oficial que relata e esclarece os fatos e versões apresentadas daquele dia”, ressalta.
A conclusão do inquérito é que os agentes agiram em legítima defesa e não existiu infração administrativa dos policiais do Bope, que “agiram de acordo com protocolos internacionalmente aceitos”, sem infringir em “crimes militares”.
O caso
Wesley chegou para o serviço por volta das 8h, na sede da delegacia de Itacaré, e antes de deixar a unidade uma hora depois alegando que precisava resolver um problema particular, carregou a sua pistola de uso pessoal, uma outra calibre .40, e um fuzil .556, com capacidade para 30 disparos. É ele que aparece nas mãos do soldado horas depois nas imagens que ficaram famosas em todo o país. No dia anterior, familiares e pessoas próximas relataram que ele tinha apresentado uma mudança no comportamento, mas conseguiram contornar a situação de foram tranquilas.
Sem retornar ao posto, a sua ausência começa a ser notada por volta das 11h. O coordenador da região aciona guarnições das proximidades para tentar localizar o soldado. Ao constatarem que ele não estava mais em Itacaré, ampliaram o raio de ação da procura.
Nas diligências, detectaram duas violações de pedágio em Amélia Rodrigues e Simões Filho, que registraram a passagem de Wesley em seu veículo.
Já em Salvador, um movimento arriscado chamou a atenção de uma viatura que iniciou a perseguição. Na Avenida Centenário, no Dique do Tororó, Wesley dirigiu 200 metros na contramão, chamando a atenção de todos que estavam no local.
Os policiais seguiram Wesley até o Farol e quando perceberam que ele desceu do carro com o fuzil em mãos, iniciaram o cerco na localidade, que no dia estava sem tanto movimento pois estava vetada a circulação de pessoas em razão do momento da pandemia de Covid-19.
Um negociador experiente foi chamado, do sexo masculino, que tentou insistentemente, durante horas, convencer Wesley de ceder. Foram colocadas duas equipes táticas em ruas diferentes e dois atiradores de elite localizados à distância, na Cabana da Barra e no Edifício Oceania. Um psicólogo também participou a todo momento da ação.
Com o passar do tempo e da hostilidade do PM com o negociador, o Bope decidiu por outra estratégia e tentou uma nova negociadora, dessa vez uma mulher, para tentar provocar uma reação distinta em Wesley. Contudo, foi justamente quando ele se virou e atirou contra os colegas.
Possibilidades
Na coletiva de imprensa, o corregedor geral, coronel César Magnavita, e o tenente-coronel Ceita, listaram as possibilidades que fora levantadas pela imprensa e pela população à época, sobre o que poderia ter sido feito para evitar a morte do policial.
Conforme os oficiais, diversas medidas eram perigosas, pois podiam aumentar o estado de irritação de Wesley, que xingava e proferia palavras de ordem. Seriam elas o uso de explosivos e também um disparo em uma das mãos que usava para segurar o fuzil.
O uso de cachorros policiais, colocado em prática, também não avançou, pois, assim que os animais chegaram, Wesley saiu do raio de ação de 10 metros, necessários para algum tipo de intervenção.